ser amada é quase que como ser ressuscitada

Isadora de Castro
2 min read5 days ago

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luto contra o sossego que dói minhas juntas e as partes tênues da silhueta que me forma. ouço baixo o vazio sereno que cai dentro de mim feito cachoeira sob as pedras.

respiro frenética o ar puro que sobrevoa, teimoso, minhas narinas desacostumadas com o cheiro límpido.

ser amada, hoje, é quase que como ser ressuscitada.

é sentir o toque envelhecido do carinho que conheço bem, é aproveitar a gota do gozo molhado que percorre da minha nuca ao meu cóccix, como se caminhos já fossem obsoletos e o que importasse mesmo, fosse a trajetória.

é ouvir música de ninar em meio sua voz rouca e sentir o arrepio singelo do seu toque grosso.

é não carecer de pesos nem medidas.

é poder enfrentar uma maratona de corrida às duas da manhã ou gritar alto contra os ventos que bagunçam o meu cabelo aos cento e oitenta quilômetros do seu carro em alta velocidade.

é a vida me oferecendo um jantar enquanto sento no meio fio da calçada só para te ver chegar.

é aceitar os beijos doces, os destinos frágeis e o desatino do compasso que percorre a frequência entre a minha pele e o meu coração.

é poder sentir e promover carícias dentro deste abismo de coisas e rachaduras que pereceram no interior do meu eu, como se ele não fosse tão indigno assim.

é sentir o formigar dos olhos que antecedem a gota salgada que percorre a minha têmpora: apenas ao te ver tão entregue.

é saber amar o detalhe, a saudade, a sucessão de tropeços e o enlace dado pelos dedos.

te amar, hoje, é quase que como ser ressuscitada.

é relembrar os motivos para gritar todas as ausências porque tudo que me consome é a sua presença tenra. honesta. certeira.

é saber que seu tato maior começou em seu cuidado comigo e que cada traço que tenho eternizado na pele, hoje parece insignificante — se comparado ao frisson do seu toque sob as linhas já desenhadas.

é lembrar o quão raros são os encontros capazes de nos tirar o fôlego, mas, ainda assim, nos ensinar a paz.

a paz destes olhos capazes de me comer viva e inteira.

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